Dizem que São Paulo é o lugar das oportunidades, do trabalho, dos contatos, das faculdades, da arte e de muitas culturas. Por um lado sim, é uma cidade cheia de encontros e encantos e também uma cidade cheia de ilusão.
Vim morar aqui pela segunda vez, tendo estudado em uma faculdade pública fora daqui, morado em outro país, aprendido outra língua e tendo me especializado em um setor como de artes gráficas, acreditava que aqui seria o lugar ideal para viver, morar e trabalhar.
Na busca por um emprego ideal que não encontrei, acabei indo trabalhar em uma confecção de vestuário de porte médio da Vila Madalena. Lá eu exercia muitas funções, de motorista à fiscal de controle de qualidade dos produtos que chegavam das oficinas de costura. Não demorou muito tempo pra que eu aprendesse como todo o sistema operacional e nada criativo acontecia e perceber que eu era muito mal remunerada por todo o trabalho que realizava.
Parte desse trabalho consistia em ir ao Bom retiro pelo menos duas vezes por semana para comprar todos os aviamentos para a produção das roupas. Reparei que em todos os armarinhos que eu freqüentava haviam muitos bolivianos fazendo o mesmo trabalho que eu e então fui investigar mais sobre essa onda migratória muito forte naquela região.
Como muitos sabem e muitos não, centenas de bolivianos vem para o Brasil com a promessa de encontrar aqui oportunidades de trabalho, melhor qualidade de vida e acesso à coisas básicas que até então não dávamos o mínimo de valor, como água potável e tratada. O que acontece com esses estrangeiros na realidade, é bem diferente. Muitos deles são iludidos pela idéia de que receberão um salário em troca de trabalho, mas o que eles de fato entregam é a sua liberdade. Confecções do Bom Retiro, Brás e outras regiões de São Paulo empregam mão de obra boliviana no regime de escravidão, onde eles são forçados a trabalhar mais de 8 horas por dia, sem horário de almoço, folgas em fins de semana e feriados. São mantidos como reféns, com seus documentos retidos pelo estabelecimento, ou como já ouvi de várias costureiras, presos com o pé amarrado na mesa da máquina.
Através de uma insatisfação pessoal, por me sentir explorada e oprimida em um regime de trabalho que não me permitia nenhum exercício intelectual e criativo me deparei com um problema em proporções bem maiores e complexas. Situações diferentes, mas com origens em comum.
Os bolivianos e muitas pessoas que conheço se submetem à um sistema de trabalho cuja contrapartida não é suficiente para bancar nosso próprio custo de morar em São Paulo. São iludidos pela idéia atraente da oportunidade, chance de crescimento, aprendizado e forçados a desdobrar múltiplas funções e papéis para manter vivo um sistema que se vira contra nós mesmos; para manter grandes empresas e toda uma rede comprometida com o seu próprio